Olhares Palavras Momentos

segunda-feira, novembro 30, 2009

sábado, novembro 28, 2009

quanto de aflição é tempo que vos resta?

No fundo da cama, nesse canto que não querias ter caído. A casa as paredes mesmo as portas passarão sem ti, alguém outro pintará o muro do branco vivo que nos anos se perde, outra voz receberá as visitas, neste quarto e noutra cama um casal talvez novo. A casa dividida no ar extinto de janela fechada, na música querida que deixou de tocar, no silêncio incomodado desse revezar de filhos. Devagar o mundo se fez pesado nessa tua fraqueza, nesse desquerer de mais anos, nesse rosto frisado que te reveste. Na entrada, em frente, o teu amor encostado (quantos beijos naquele ombro?, quantos segredos esquecidos juntos?, quanto de aflição é tempo que vos resta?) de olhar vivo, como uma lágrima esgotada a dizer algo que não entendes. Querias contar-lhe uma memória vossa que aos dois fizesse rir mas o riso não vem e apressa a madrugada. Já é tarde, tens sono.

segunda-feira, novembro 23, 2009

sábado, novembro 21, 2009

e naqueles rostos

As rodas do autocarro escondem os buracos da estrada que tão bem conheces. Recomeça tudo nesta nova madrugada, os candeeiros ainda acesos, as ruas de carros detidos, as pessoas já sentadas na paragem. Pouco passa das cinco horas e naqueles rostos o cansaço de ontem, o lutar do mês, a miséria de cada vida. Ninguém conversa, não lhes vês os olhos nem as mãos. Estão fechados no frio da noite e levantados agora à resposta da tua chegada. Páras e abrem-se as portas ao bairro. Conheces as caras de quase todos que entram, nomes e mais nomes desfilados no silêncio da manhã, a Emília na sua viagem de três horas e quatro transportes que agora começa, os dois Zés da enorme construção no outro lado da cidade, o Luís ajudante de padeiro que já foi advogado, a Ana e o filho diabético (qual o nome do menino? não te lembras e isso envergonha-te e cala-te, estupidamente sabes bem, pois por isso e só por isso não respondes ao sorriso por aparar nos olhos dela).

segunda-feira, novembro 16, 2009

sábado, novembro 14, 2009

um bloco branco que imagino guardado

Eu sentado e um amigo. A dividir-nos quatro copos, dois pratos, muitos talheres, um rasgo no canto da toalha a ver-se pelo papel que a protege. Ele nas opções do menu e eu de olhos em volta esquecido da promessa de fome que o costume diário propõe. É cedo, o restaurante está vazio, as mesas a separar cadeiras, o aquário de lagostas que borbulha, o empregado que nos sentou a afastar-se e no bolso uma caneta e um bloco branco que imagino guardado. Passou agora por uma quase menina, uma mulher de Leste de queixo segurado pelas mãos no balcão que, na espera dessa confusão que se adivinha, toda ela naqueles olhos a olhar para fora, não sei se para o céu, se para a demora dos anos, se da família que deixou.

segunda-feira, novembro 09, 2009

sábado, novembro 07, 2009

e a mãe num sorriso tentado

Esta praceta chegada entre apertadas ruas de Lisboa. Nela uma senhora sentada, rabo-de-cavalo sobre o ombro esquerdo, concentrada entre pombos e a mão indecisa nas palavras cruzadas. A fonte esgotada de água verde, dois pardais a beber-lhe e um menino que os assusta (naqueles pequenos braços agitados quantas promessas futuras, quantas mentiras verdades momentos respostas, quantos colos por sustentar?) Outra senhora, meio saco branco de mercearia e uma bolsa gasta bege aberta num fecho estragado a brincar às palavras com um bebé e a mãe num sorriso tentado sobre as lágrimas que não secaram. Nenhuma delas fala e já se afastam. E tantas folhas neste verão caídas! Carros que passam ao largo (não os oiço) e um telemóvel que estraga o feitiço deste silêncio que discreto se punha em mim.

segunda-feira, novembro 02, 2009

Posts Anteriores